quarta-feira, 6 de julho de 2011

Manuel António Pina e o Sítio do não-se-sabe-onde


«Penso que o teatro infantil não deve ser nada. Dever ser o que quer que seja é exactamente o contrário do que, julgo eu, é a arte: liberdade. (…) A imaginação, como tempo e lugar privilegiado de liberdade, é naturalmente tempo e lugar privilegiado da arte. (…) Eu não escrevo para provar nada; nem para ensinar nada, muito menos às crianças. (…) O teatro infantil (o teatro!) não deve ser nada, não tem que ser nada. Se calhar nem mesmo teatro» (Pina, 2007: 126).


Acerca do autor

Nascido no Sabugal, Guarda, em 1943, Manuel António Pina foi jornalista durante várias décadas e estreou-se na poesia em 1974 com o livro “Ainda Não É o Fim nem o Princípio do Mundo Calma É Apenas Um Pouco Tarde”. No ano anterior publicara o seu primeiro livro para crianças, “O País das Pessoas de Pernas para o Ar”. Consensualmente reconhecido como um dos melhores cronistas de língua portuguesa – ainda hoje assina uma crónica diária no Jornal de Notícias –, Manuel António Pina publicou dezenas de livros de poesia e de literatura para crianças, mas só em 2003 se aventurou na ficção “para adultos”, com “Os Papéis de K.”. 

Se a sua obra de ficção é menos conhecida internacionalmente, a sua poesia está traduzida na generalidade das línguas europeias. O seu mais recente livro de poemas, intitulado “Os Livros” (Assírio & Alvim, 2003) venceu os prémios de poesia da Associação Portuguesa de Escritores e a da Fundação Luís Miguel Nava. Em Maio de 2011 é premiado com o Prémio Camões, o maior prémio literário de Língua Portuguesa, destinado a galardoar um autor de língua portuguesa pelo conjunto da sua obra.


Manuel António Pina e a literatura dramática para crianças

Tendo em conta o potencial receptor da sua produção literária, salienta-se um maior número de obras poéticas destinadas a adultos, enquanto, para a infância, é o texto dramático que possui um notório relevo, assinando o autor mais de duas dezenas de títulos. Com efeito, MAP é um dos autores que – juntamente, por exemplo, com António Torrado – mais têm contribuído para a legitimação da literatura dramática e/ou do teatro para crianças em Portugal. A sua ligação profunda, entusiasmada e conhecedora ao teatro reflecte-se, por exemplo, no facto de, em 1978, ter sido um dos sócios-fundadores da Companhia portuense Pé de Vento, de, em 1982, ter sido bolseiro do Centro Internacional de Teatro de Berlim junto do Grips Theater, e de ter recebido, em 1988, o prémio do Centro Português para o Teatro para a Infância e a Juventude (CPTIJ), pelo conjunto da sua obra neste domínio. Acrescente-se, ainda, o elevado número de textos seus levados à cena por inúmeras companhias de teatro portuguesas.

Manuel António Pina e os desafios da linguagem
O humor, as interrogações em torno da linguagem, da conversa e da desconversa, bem como a reflexão sobre as relações entre pensamento e linguagem constituem aspectos a ter em conta na abordagem de uma obra que, sendo um caso singular na nossa literatura para a infância, se inscreve numa tradição cujo representante máximo é, provavelmente, Lewis Carroll – autor que, juntamente com A. A. Milne, integra o núcleo das preferências literárias de Manuel António Pina.

Apresentação do espectáculo

A capacidade deste autor de fazer mergulhar miúdos e graúdos no inverso onírico e mágico da palavra-bailarina, da palavra-trapezista, da palavra- palhaço, da palavra-pintora determinou a escolha dos textos de Manuel António Pina como inspiração para este espectáculo.

O SÍTIO DO NAO-SE-SABE-ONDE é uma peça de teatro para crianças do Pré-escolar e do Primeiro Ciclo, concebida a partir de alguns dos  textos  mais marcantes de Manuel António Pina para a infância, que vão desde a poesia ao texto teatral, alguns deles recomendados pelo Plano Nacional de Leitura para o primeiro ciclo.
Neste espectáculo,  podem-se encontrar excertos e personagens de "Gigões & anantes" (1974), "O têpluquê" (1976), "O pássaro da cabeça" (1983); "Nenhum sítio" (1984), "O inventão" (1987), e de "Histórias que me contaste tu" (1999). Salientamos, nesta escolha, a obra o Inventão, que, nas palavras de Álvaro Magalhães, «… é talvez o melhor livro de sempre na literatura infantil» (citado por Rita Pimenta in Público de 13 de Maio de 2011), um achado em termos de criatividade linguística, com não poucos incentivos à reflexão, susceptíveis de estimular o chamado pensamento divergente e o “ Histórias que me contaste tu”, em que, o Escaravelho Bocage, contador de histórias, personagem deliciosa do imaginário de Manuel António Pina, volta a aparecer, não se sabe bem de onde (como sempre), para deixar mais uma mão cheia de contos envoltos num denso nevoeiro onde se confundem as personagens, a ordem cronológica e até as palavras.

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